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Publicado em 12-Abr-2016 às 14:52

Apoio estatal à inovação melhorou

A maior parte das empresas já começa a entender melhor a realidade da investigação académica, mas ainda tem dificuldade em comprometer-se com o risco.

 

A melhoria dos apoios estatais à inovação tem sido crucial para a estrutura de investigação criada há 25 anos na Universidade do Minho e para o seu relacionamento com o mercado empresarial, num país marcado por uma cultura de aversão ao risco, que está associada ao estigma social do fracasso e de resistência à mudança.

Segundo Pedro Silva, coordenador de Comercialização de Ciência & Tecnologia – TECMinho, a maior parte das empresas já começa a entender melhor a realidade da investigação académica, mas ainda tem dificuldade em comprometer-se com o risco. O problema não está todo do lado das empresas. Nas universidades, nem todos os investigadores têm a motivação ou a apetência para pensar a sua investigação de acordo com lógicas de mercado.

No caso da Universidade do Minho, o panorama parece encorajador. Só nos últimos dois anos, tiveram cerca de 200 empresas que os contactaram para serviços e projectos de Investigação, Desenvolvimento e Inovação (IDI). Ao nível agrícola, a TECMinho tem colaborado com empresas do sector agro-alimentar, tal como tem abraçado vários projectos que envolvem as áreas da biotecnologia, da biologia e da química na melhoria de processos e de produtos vitivinícolas.

 

 

Como se pode definir o papel da TECMinho na sua interacção com as empresas portuguesas, desde a sua criação?

Na sua qualidade de interface da Universidade do Minho (UMinho), a TECMinho tem desempenhado um papel relevante enquanto agente promotor da inovação, mormente através da valorização e transferência de conhecimento para empresas nacionais (e internacionais).

O trabalho desenvolvido pela TECMinho ao longo dos seus 25 anos de existência fortaleceu as ligações da universidade ao tecido empresarial nas vertentes da tecnologia e da inovação, permitindo a valorização do conhecimento produzido na academia, o aumento da competitividade das empresas e o reforço das competências dos recursos humanos da região.

O impacto da TECMinho pode ser mais bem evidenciado através de alguns indicadores acumulados da sua actividade:          5.700 empresas e 800 investigadores envolvidos em transferência de conhecimento; 480 contratos de I&D e de transferência de tecnologia/know-how com a indústria; 700 tecnologias identificadas e promovidas internacionalmente; 270 pedidos de patentes; 120 novas empresas apoiadas, das quais 55 com estatuto de spin-off UMinho; 1.950 acções de formação (presencial e e-learning) para mais de 30.000 formandos.

 

Quais os principais desafios que se colocam ao sector agro-industrial em Portugal?

Não sendo um especialista no sector agro-industrial, diria, na qualidade de consumidor, que o principal desafio do sector é, primeiro de tudo, garantir a sustentabilidade e a qualidade dos recursos e produtos agro-alimentares primários, para que as gerações futuras possam continuar a usufruir dos produtos únicos que a terra e o mar oferecem em Portugal.

Este é um desafio especialmente difícil nos tempos que correm, tendo em conta as condições económicas, comerciais e regulamentares que têm exercido uma pressão insustentável para muitos agentes e empresas do sector, muito especialmente para os que estão pior posicionados na cadeia de valor.

Por outro lado, diria que o sector continua a enfrentar o desafio da internacionalização, pesem embora alguns bons exemplos históricos e mais recentes. A este nível, a atomização do sector, o proteccionismo de mercados externos, a logística e o investimento necessário estarão certamente entre as barreiras que tornam o desafio mais complexo.

Por último, mais recentemente, parecem-me evidentes os esforços das principais marcas do sector em tentar convencer os consumidores da qualidade e benefícios dos seus produtos, assim como da observância de elevados princípios de responsabilidade social e ambiental. Creio que não será descabido dizer que o consumidor final mudou muito nos últimos anos, estando cada vez mais sensibilizado para a importância da alimentação e do ambiente para a saúde e qualidade de vida.

 

Que papel desempenha a inovação para responder a esses desafios?

A inovação tem desempenhado, e continuará a desempenhar, um papel importante na resposta a alguns dos desafios apresentados.

São vários os exemplos de inovação (de produto, de processo, de serviço, de negócio, organizacional, etc.) de empresas e agentes nacionais do sector agro-alimentar. Pelas funções que exerço, lido normalmente com empresas e organizações que encaram a inovação como um factor dinâmico essencial ao seu desenvolvimento e crescimento. É notório o crescimento do número de empresas do sector que procuram a UMinho (e outras entidades do sistema científico e tecnológico nacional) para encontrar respostas a problemas específicos ou para identificar novas oportunidades de inovação.

Diria, no entanto, que as respostas aos principais desafios que podem obstar ao desenvolvimento sustentável do sector têm de ser encontradas colectivamente, envolvendo todos os agentes que o compõem ou influenciam. Na minha opinião, o sector agro-alimentar, pela importância que assume para a vida e pela sua composição e dinâmica, é um dos sectores da economia em que a mobilização de agentes em torno de temas de inovação estruturantes faz mais sentido.

Também é importante dizer que a própria inovação é um desafio para esta área. Sendo um sector altamente regulamentado, bastante proteccionista e com fortes pressões a montante e a jusante, muitas inovações acabam por não ter viabilidade para ser implementadas ou chegar ao mercado. O desafio é ainda maior no que diz respeito a projectos mobilizadores de inovação, pois podem acrescer às limitações já apontadas questões culturais e concorrenciais.

 

Quais as áreas, ao nível do sector primário, em que a colaboração da TECMinho com empresas nacionais tem sido mais relevante?

Tendo em conta que a UMinho não tem oferta de formação e investigação em ciências agro-pecuárias, a relação da TECMinho com o sector primário acaba por ser pouco extensa e está praticamente confinada a relações com empresas do sector vitivinícola. Temos tido vários projectos com empresas que envolvem as áreas da biotecnologia, da biologia e da química na melhoria de processos e de produtos vitivinícolas.

As relações da TECMinho com empresas do sector agro-alimentar passam essencialmente pela indústria transformadora, havendo relações com grandes empresas (incluindo multinacionais) e com PME. No passado e no presente, já teremos tido relações com empresas de quase todas as fileiras do sector, sendo difícil, ou porventura injusto, destacar uma fileira que tenha beneficiado mais da nossa intervenção.

 

Que casos de sucesso, parcerias e colaboração com empresas podem destacar na TECMinho?

Todas as colaborações com empresas que resultaram na transferência de conhecimento da UMinho são casos de sucesso para nós, independentemente do alcance dos seus resultados (local, regional, nacional ou internacional) ou das receitas geradas para a TECMinho e/ou para a UMinho.

São casos de sucesso para nós qualquer colaboração que tenha permitido a transferência de conhecimento via integração de mestres e doutores em empresas; formação contínua de colaboradores de empresas; consultoria especializada; prestação de serviços de análise e caracterização com recurso a laboratórios especializados; investigação contratada; investigação colaborativa; acordos de transferência de tecnologia; acordos de licença de propriedade industrial da UMinho com empresas existentes ou empresas nascentes; criação de novas empresas para exploração de conhecimento da UMinho. Este espectro de colaborações pode ter maior ou menor carácter de formalidade; maior ou menor grau de intensidade/novidade científica e tecnológica; e investimentos de empresas que podem ir de poucas centenas a muitos milhões de euros.

É muito gratificante ver novas empresas, novos produtos ou novos processos desenvolvidos com o nosso apoio a terem sucesso no mercado, sobretudo se derem resposta a necessidades importantes da sociedade. Não gostaria de destacar casos de sucesso. Seria injusto e prefiro que sejam as próprias empresas a falar do seu sucesso e, se considerarem oportuno, a creditar o nosso papel.

 

Considera que os apoios estatais e outros têm sido suficientes para promover a vossa actividade e o intercâmbio de informação científica e tecnológica com o tecido empresarial?

Sem dúvida que sim. O Estado tem tido um papel preponderante ao criar instrumentos de financiamento que têm estimulado significativamente a aproximação do tecido empresarial às universidades e outros agentes científicos e tecnológicos. E o contrário também, claro. Coloco a tónica na iniciativa do tecido empresarial, porque existe uma realidade pré e pós-QREN, na minha opinião.

O QREN traduziu-se num aumento exponencial de colaborações/projectos de IDI (Investigação, Desenvolvimento e Inovação) propostos por iniciativa de empresas. Antes do QREN já tínhamos actividade de colaboração com empresas, mas esta era maioritariamente originada pela iniciativa da TECMinho/UMinho. Além disso, a tipologia de incentivo Vale I&D/Vale Inovação, introduzida pela primeira vez com o QREN, “democratizou” o acesso de empresas a fontes externas de inovação, por constituir um instrumento de financiamento de fácil acesso e que configura montantes de investimento comportáveis por um universo alargado de PME.

Além disso, o Estado também tem sabido reconhecer a importância das interfaces e dos gabinetes de transferência de tecnologia académicos para a difusão e valorização do conhecimento gerado pelas universidades. Vários têm sido os programas e os instrumentos financeiros que o Estado tem promovido para consolidar e capacitar entidades como a TECMinho e promover a sua articulação em rede.

Talvez exista uma lacuna no que diz respeito ao financiamento directo de centros de investigação para a demonstração da viabilidade técnica de tecnologias promissoras através de provas de conceito, pese embora a emergência de um mercado de capital de risco, fortemente apoiado pelo Estado. Este tipo de financiamento, que poderia ser algo semelhante a um Vale, talvez com valores um pouco superiores, dependendo da área do projecto, necessitaria, no entanto, de um envolvimento das possíveis empresas tomadoras das tecnologias. Este envolvimento garantiria que as provas de conceito fossem especificadas de acordo com as necessidades do mercado, de modo a garantir que os resultados possam determinar claramente o potencial de tecnologias para o mercado.

 

Quais são as maiores dificuldades que a TECMinho encontra no país, que entravam a sua actividade? Seja ao nível académico e de investigação, seja ao nível da realidade das empresas?

Quando se está na fronteira de duas realidades distintas, no caso o meio académico e o meio empresarial, num papel de intermediação e negociação, existem as dificuldades inerentes a qualquer processo de alinhamento de culturas e de interesses que apresentam divergências. Trata-se de um novo tipo de “diplomacia”, em que é preciso compreender bem as realidades específicas de modo a serem criadas as condições necessárias ao estabelecimento de relações frutíferas e duradouras. Num primeiro momento, o nosso papel é analisar se existem condições de partida, de um lado e do outro, que configurem boas perspectivas para a relação a estabelecer.

O principal problema do país continua a ser cultural e é transversal aos vários agentes envolvidos em processos de inovação priligy generic online. Falo de uma cultura ainda prevalente de aversão ao risco, que está associada ao estigma social do fracasso, e de resistência à mudança, muitas vezes por algum pessimismo ou comodismo.

A maior parte das empresas já começa a entender melhor a realidade da investigação académica, mas ainda tem dificuldade em comprometer-se com o risco e longos tempos para o mercado. Outras ainda não demonstram capacidade para capitalizar no mercado as inovações que alcançaram em colaborações com centros de investigação. A existência de uma visão estratégica do negócio a longo prazo é um dos factores que mais contribuem para o sucesso de qualquer investimento em inovação.

Do lado das universidades, nem todos os investigadores têm motivação ou apetência para pensar a sua investigação de acordo com lógicas de mercado, o que não pode ser visto de forma negativa, claro. O facto de a progressão na carreira ainda depender muito pouco do sucesso na valorização de competências e resultados de investigação acaba por não servir de estímulo a muitos também.

Felizmente, temos sinais evidentes de que se está a operar um processo de transformação cultural em Portugal. Temos cada vez mais jovens qualificados com vontade de iniciar o seu próprio negócio ou de implementar iniciativas empreendedoras nas empresas que integram. Temos cada vez mais investigadores (docentes) envolvidos em colaborações com empresas e motivados para criar valor a partir da sua investigação. Temos cada vez mais administradores de empresas a colocar a inovação como prioridade estratégica dos seus negócios. Temos uma comunidade de capital de risco a crescer e muitos novos projectos empresariais a serem financiados através de fundos públicos e privados.

Estamos num processo de transformação e aprendizagem. Se já se pode falar de um sistema de inovação em Portugal, eu considero que o mesmo ainda está num nível de maturidade muito inicial. A gestão da IDI pelos vários agentes da sociedade, incluindo os próprios gabinetes de transferência de tecnologia, é uma prática complexa e ainda pouco consolidada. E apesar das boas práticas existentes e do contacto com realidades mais evoluídas, só o acumular de experiência (e sobretudo de fracassos) permitirá amadurecer o sistema. Não quero com isto desresponsabilizar os agentes de inovação, incluindo o próprio Estado, que devem garantir que não sejam desperdiçados recursos públicos em projectos que estão condenados ao fracasso desde o início ou em que se pode avaliar rapidamente se têm ou não potencial.

 

Tem havido da parte das empresas uma crescente procura do conhecimento e dos serviços disponibilizados pela TECMinho?

Já tive oportunidade de aludir a esse aumento da iniciativa das empresas na procura de soluções e oportunidades para o desenvolvimento e crescimento dos seus negócios.

Só nos últimos dois anos, para se ter uma ideia, tivemos cerca de 200 empresas que nos contactaram para serviços/projectos de IDI.

O número é muito maior se contarmos empresas às quais prestámos serviços de protecção de propriedade industrial, às quais apresentámos tecnologias da UMinho ou às quais prestámos serviços de formação contínua. Antes de 2008, se tínhamos 20 empresas por ano a contactarem-nos para serviços/projectos de IDI era muito.

 

Qual a importância que atribuem à inovação e à investigação académica na valorização dos produtos nacionais, especialmente tendo em vista os mercados internacionais?

Acreditamos que o impacto da transferência do conhecimento da UMinho (directamente, via TECMinho ou via outras interfaces) para a sociedade, nomeadamente para o tecido empresarial, é muito maior do que o que é visível e imaginável para nós. Um estudo de 2013 apresentava que apenas as 113 empresas criadas por pessoas com ligações à UMinho geraram 2.226 novos postos de trabalho e um volume de negócios anual de 362 milhões de euros.

Temos tecnologias desenvolvidas na UMinho a integrar produtos e soluções de grandes marcas a nível mundial; muitas outras que estão a caminho do mercado, através de multinacionais (sediadas ou não em Portugal) e PME (nacionais e estrangeiras) com perspectivas de negócios internacionais muito promissoras.

Temos ainda várias empresas start-up que nasceram do conhecimento produzido na UMinho com um alcance internacional desde o seu arranque; outras, que tendo concentrado o seu negócio em Portugal numa fase inicial, começam agora a penetrar em mercados internacionais; e outras ainda, na forja, com imenso potencial de crescimento e vocação 100% exportadora.

 

Quais as metas a curto prazo que a TECMinho quer atingir no desenvolvimento das suas competências?

Todas as actividades, projectos e serviços da TECMinho, independentemente da sua envergadura, têm missões e metas específicas muito importantes para o desenvolvimento de diferentes agentes de inovação nacionais e internacionais. No seu conjunto, apresentam desafios múltiplos que contribuem para o desenvolvimento das competências dos seus quadros e da organização como um todo.

Podemos, no entanto, destacar algumas actividades que têm maior impacto na projecção internacional da TECMinho.

A TECMinho vai ter a honra de ver a sua diretora do Departamento de Transferência de Tecnologia, Marta Catarino, a assumir a presidência da associação europeia de profissionais de valorização do conhecimento e transferência de tecnologia universidade-empresa, a ASTP-Proton, em Maio de 2016. A associação agrega, actualmente, cerca de 650 membros de 41 países. Tem como principais actividades a formação, capacitação e partilha de boas práticas entre profissionais e organizações da área, assim como servir de plataforma às redes nacionais de valorização do conhecimento.

A TECMinho tem também a responsabilidade actual de gerir o primeiro acelerador europeu de projectos inovadores na área da nanomedicina: o TAB – Nanomedicine Translation Advisory Board (www.nanomedtab.eu).

Este acelerador é composto por um conjunto de especialistas das indústrias farmacêuticas, biotecnológica e de dispositivos médicos que seleccionam, orientam e acompanham os projectos com maior potencial de chegar ao mercado. O TAB está neste momento a acompanhar 23 projectos inovadores provenientes de empresas e centros de investigação de dez países europeus e países associados.

O TAB é um instrumento financiado pela Comissão Europeia no âmbito do projecto ENATRANS – Enabling Nanomedicine Translation, uma acção financiada pelo programa Horizonte 2020. Este instrumento é visto pela Comissão Europeia como uma espécie de prova de conceito de um modelo de acelerador que se pretende alargar a todas as tecnologias de largo espectro que têm aplicação na área da saúde.